Congresso Nacional promulga a Emenda Constitucional n. 132, alterando o sistema tributário nacional
Em 20 de dezembro de 2023, o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional n. 132, resultado da proposta de Emenda à Constituição (“PEC”) 45/2019. É a primeira reforma ampla sobre o sistema tributário nacional desde a vigência da Constituição Federal de 1988.
Como divulgado em nosso informativo anterior, a principal alteração da reforma foi a unificação dos tributos sobre o consumo (IPI, PIS, COFINS, ICMS e ISS), mas também foram promovidas importantes alterações a tributos sobre a propriedade (IPTU e IPVA) e sobre a transmissão de bens e direitos (ITCMD).
A Emenda Constitucional também prevê que, em até 180 dias contados de sua promulgação, o Poder Executivo deverá encaminhar ao Congresso Nacional um projeto de lei de reforma do imposto de renda.
Agora, os Estados, o Distrito Federal e Municípios terão competência para editar a legislação aplicável.
A Emenda Constitucional n. 132 trata principalmente da unificação dos tributos sobre o consumo no Brasil. A tributação do consumo é atualmente realizada por meio de cinco tributos: na esfera federal, o Imposto sobre Produtos Industrializados (“IPI”), a Contribuição para o Programa de Integração Social (“PIS”) e a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (“COFINS”); na esfera estadual, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte e Comunicação (“ICMS”); e, na esfera municipal, o Imposto Sobre Serviços (“ISS”).
Com a promulgação da Emenda Constitucional, o IPI, PIS, COFINS, ICMS e ISS serão substituídos por um imposto sobre o valor agregado (“IVA”) dual, que incidirá sobre bens e serviços e será composto por um Imposto sobre Bens e Serviços (“IBS”) e uma Contribuição sobre Bens e Serviços (“CBS”). O IBS será de competência dos Estados, Distrito Federal e Municípios. A CBS será de competência da União. Além disso, seria instituído um Imposto Seletivo (“IS”) sobre bens e serviços não essenciais ou nocivos à saúde e meio ambiente, de competência da União.
A União administrará a CBS exclusivamente, e os Estados e Municípios compartilharão a administração do IBS em um Conselho Federativo. A implementação será gradual, de 2026 até 2033.
Além dos tributos sobre o consumo, a Emenda Constitucional n. 132 trouxe mudanças em outros tributos estaduais e municipais, como o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (“ITCMD”), o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (“IPVA”) e o Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana (“IPTU”).
Comentamos abaixo as principais alterações que podem impactar o planejamento patrimonial e sucessório das pessoas físicas.
a) ITCMD
De acordo com a regra constitucional então vigente, o ITCMD incidente sobre as transmissões de bens e direitos por herança ou doação, no Brasil, compete:
- No caso de bens imóveis e direitos a ele relacionados, ao Estado (ou ao Distrito Federal) do local do imóvel; e
- No caso de bens móveis, títulos e créditos, ao Estado (ou ao Distrito Federal) do local do processamento do inventário, ou do domicílio do doador;
Não houve mudanças à competência para cobrança do ITCMD sobre doações e heranças no Brasil. A Emenda Constitucional n. 132 apenas alterou a expressão “local de processamento do inventário” para “local onde era domiciliado o de cujus”, o que, em termos práticos, já correspondia ao local onde era domiciliado o de cujus (de acordo com o art. 48 do Código de Processo Civil).
A Emenda Constitucional incluiu previsão expressa de que o ITCMD passará a ser progressivo, ou seja, com alíquotas que variam em razão dos valores do quinhão, do legado ou da doação. Atualmente, apenas alguns Estados já adotam alíquotas progressivas para o ITCMD, como é o caso do Rio de Janeiro, onde as alíquotas são atualmente de 4% a 8%. A maior parte dos Estados ainda adota uma alíquota fixa do ITCMD, como em São Paulo, que atualmente aplica a alíquota de 4%.
É relevante a alteração na competência para cobrança do ITCMD nas transmissões de bens e direitos no exterior. Até a promulgação da Emenda, a Constituição previa que a competência para cobrança do ITCMD seria definida por lei complementar nas seguintes hipóteses: (i) quando o doador tiver domicílio ou residência no exterior; e (ii) se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior.
Até o momento, não foi editada lei complementar e a questão chegou ao Supremo Tribunal Federal (“STF”), que suspendeu a cobrança do tributo até que fosse editada referida lei.
A Emenda Constitucional n. 132 não eliminou a necessidade de lei complementar, contudo, regulamentou diretamente a questão permitindo aos Estados e ao Distrito Federal já cobrar o ITCMD, até que seja editada a lei complementar.
O quadro abaixo resume as competências para cobrança do ITCMD, nos termos do artigo 16 da Emenda Constitucional n. 132:
Hipótese |
Localização |
Competência |
|
|||
|
De cujus / doador |
Bem |
Herdeiro / donatário |
|
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Doação de bens imóveis e respectivos direitos localizados no Brasil |
Brasil ou exterior |
IMÓVEL no Brasil |
Brasil ou exterior |
Estado (ou ao Distrito Federal) onde está localizado o bem |
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Doador domiciliado no exterior |
Exterior |
MÓVEL no Brasil ou exterior |
Brasil |
Estado (ou ao Distrito Federal) de domicílio do donatário |
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Donatário domiciliado no exterior |
Exterior |
MÓVEL no Brasil |
Exterior |
Estado (ou ao Distrito Federal) em que se encontrar o bem |
||
Sucessão - de cujus era domiciliado no Brasil |
Brasil |
MÓVEL no Brasil ou exterior |
Brasil ou exterior |
Estado (ou ao Distrito Federal) onde o de cujus era domiciliado |
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Sucessão - de cujus era domiciliado no exterior |
Exterior |
MÓVEL no Brasil ou exterior |
Brasil |
Estado (ou ao Distrito Federal) onde tiver domicílio o herdeiro ou legatário |
A partir de agora, os Estados e o Distrito Federal deverão se adaptar às novas regras constitucionais, por meio da edição de lei ordinária disciplinando a cobrança do ITCMD.
Importante notar que muito embora os Estados tenham agora competência para alterar a legislação aplicável, deverão ser respeitados o princípio da anterioridade (ou seja, a partir do ano seguinte) e o prazo nonagesimal (90 dias da publicação) de forma que as novas leis não terão aplicação imediata.
No entanto, destacamos que é possível que os Estados (ou Distrito Federal) tentem aplicar a nova legislação com base na lei local vigente, nos casos em que já prevista a cobrança do ITCMD em conformidade com as novas regras constitucionais.
b) IPVA
Além de incidir sobre a propriedade de veículos automotores terrestres, o IPVA passaria a incidir também sobre a propriedade de veículos automotores aquáticos e aéreos de uso particular. O texto prevê algumas exceções, como aeronaves agrícolas e tratores e máquinas agrícolas.
Ainda, a Emenda Constitucional prevê que o IPVA poderá ter alíquotas diferenciadas em função do tipo, do valor, da utilização e do impacto ambiental.
c) IPTU
A Emenda Constitucional passa a permitir que o IPTU tenha sua base de cálculo atualizada pelo Poder Executivo, conforme critérios estabelecidos em lei municipal.