PL nº 4/2025: As potenciais mudanças no Direito de Família e Sucessões
Acompanhe nossa série sobre a reforma do Código Civil e os principais impactos sobre o Direito de Família e Sucessões
Atualmente em trâmite perante o Senado Federal, o Projeto de Lei nº 4/2025 (“PL”) visa alterar a codificação civil vigente e legislação correlata, buscando maior aproximação da realidade social brasileira.
Vale lembrar que já se passaram mais de duas décadas desde a promulgação do código atual, que, por sua vez, já nasceu de certa forma dissociado do cotidiano das pessoas – especialmente no ramo do Direito de Família e das Sucessões – dado o longo processo legislativo que o antecedeu.
Quais as principais alterações propostas com impacto sobre esses ramos do Direito? São medidas positivas? Quais os pontos que possivelmente poderão fomentar litígios? Convidamos vocês para acompanhar e avaliar conosco nas próximas semanas.
De antemão, vemos com bons olhos a adoção de medidas e remédios capazes de desburocratizar e desjudicializar, tanto quanto possível, a vida dos cidadãos, privilegiando a autonomia da vontade. Dentre elas: o divórcio impositivo e unilateral; a supressão do instituto da separação e do conceito de culpa relacionado ao término da sociedade conjugal; possibilidade de que procedimentos de abertura, registro e cumprimento de testamento sejam realizados extrajudicialmente, de renúncia à condição de herdeiro em pactos nupciais ou convivenciais, bem como de celebração diretivas sobre colação de bens doados.
Outro ponto de extrema relevância foi a modernização de conceitos ultrapassados e incompatíveis com o ordenamento constitucional vigente, como, por exemplo, a remoção de referências a “homem” e “mulher” – substituídas pelo termo “pessoas” – no que se refere a determinadas relações jurídicas, como, por exemplo, o casamento e a união estável, solidificando a premissa de que a orientação sexual não tem relevância no tratamento jurídico dado aos cidadãos. Da mesma forma, a inclusão do convivente em diversas disposições legais que hoje se referem exclusivamente ao cônjuge.
Destacamos como positivas as alterações em torno da parentalidade, contemplando os avanços ocorridos nas últimas décadas para regrar a parentalidade socioafetiva e a multiparentalidade.
Na mesma linha, foram propostas regras gerais voltadas às entidades familiares de forma mais ampla e abrangente, o que inclui famílias monoparentais e parentais, inclusive as formadas exclusivamente por colaterais, circunstâncias cada vez mais presentes.
Também se propõe a regulamentação (ainda que de maneira incipiente) de temas relativos à reprodução humana assistida, incluindo regramento acerca da doação de gametas e regulamentando a cessão temporária de útero, além de prever a legitimidade sucessória dos embriões extracorpóreos.
Já no âmbito patrimonial, propõe-se a supressão de todo o regramento acerca do regime de participação final nos aquestos, bem como a do regime da separação obrigatória de bens; introduz-se de forma expressa a possibilidade de elaboração de pacto pós-nupcial; e autoriza-se a modificação extrajudicial do regime de bens no casamento, dentre outros.
Em consonância com discussões sociais, são previstas compensações ou proteções adicionais para o cônjuge, convivente ou indivíduo da família encarregado dos cuidados com a prole, com seus ascendentes e com a residência familiar. Os termos empregados no PL nestes casos especialmente são, muitas vezes, termos abertos, o que, de um lado, confere ao Poder Judiciário certa flexibilidade de interpretação da situação concreta e pode potencializar litígios patrimoniais, inclusive para casais unidos em regime de separação de bens, e, de outro lado, impõe aos profissionais do Direito a responsabilidade de procurar parâmetros bem definidos no desenho do planejamento patrimonial e sucessório.
No âmbito do Direito Sucessório, verificou-se a já esperada atualização para que a equiparação jurisprudencial das regras sucessórias entre cônjuges e companheiros esteja refletida no texto da lei.
Outro ponto a comemorar é a previsão expressa das diretivas antecipadas de curatela, documento que já vem sendo usado há alguns anos como importante instrumento de planejamento patrimonial e sucessório e agora poderá ganhar regulamentação específica.
Tema de grande polêmica é a proposta de retirada dos cônjuges e companheiros da concorrência sucessória com descendentes e ascendentes, especialmente quando submetidos ao regime de separação de bens, combinada à sua exclusão do rol de herdeiros necessários.
Também foram ampliadas as situações em que os herdeiros poderão ser excluídos da sucessão, quer em decorrência da prática de atos de indignidade, quer por deserdação, reforçando-se o princípio da prevalência da vontade do testador. Por outro lado, não se pode excluir a possibilidade dessa sugestão de alteração também aumentar o número de litígios sucessórios.
Por fim, busca-se regrar a transmissão sucessória de bens digitais, criando-se categorias de bens digitais patrimoniais, existenciais ou híbridas, visando clarear tema ainda bastante novo, mas potencialmente conflituoso no Direito das Sucessões.
Ressaltamos que esse texto não se presta a exaurir todas as mudanças e inovações trazidas pelo PL, mas somente pincelar algumas das que se mostram relevantes para o Direito da Família e das Sucessões. Reiteramos o convite para que acompanhem o tema em mais detalhes conosco nas próximas semanas.
*Este conteúdo foi produzido em 14 de março de 2025.
Adriane Pacheco ([email protected]), Beatriz Martinez ([email protected]), Izabel Nazarian ([email protected]) e todo time HSA estão à disposição para esclarecer quaisquer dúvidas adicionais relacionadas ao tema, tanto na prevenção de conflitos, como em questões litigiosas. As informações presentes neste conteúdo não devem ser utilizadas para fins de consultoria. Cada caso deve ser analisado de forma individual.